Chambinho: de Jaicós para o mundo



Eu estava mais nervosa que o entrevistado. Ansiosa para conhecê-lo, com as mãos geladas, pois não é todo dia que nos deparamos com histórias tão interessantes. Ao chegar à recepção do Hotel Hollyday fiquei aguardando a hora da entrevista, avisei a produtora Daniella que já havia chegado, instantes depois ouço uma voz suave dizendo: você é a Lívia? Levanto o olhar vejo aquele homem alto, com uma camisa branca rendada, calça jeans e dois chapéus de coro na mão tipicamente nordestino, seu perfume agradável começa a tomar conta do ambiente. Um sorriso tímido me cumprimenta, sentamos no sofá e iniciamos a conversa.  

Nivaldo Expedito de Carvalho (Chimbinho do acordeon)
Fotto: Sandy Swamy 



Nivaldo Expedito de Carvalho, mais conhecido como Chambinho do Acordeon, nascido em São Paulo, se considera piauiense. Descreve sobre a infância com emoção. “Interessante isso, porque antes de vir para Picos passei em Jaicós, para da benção aos meus tios, vi uma foto que tirei na minha infância essa foto me traz muitas lembranças,” conta Chambinho. Aos dois anos de idade veio com a família para o Piauí, morar com os avós que residiam em Várzea Queimada, interior de Jaicós a 347km de Teresina-PI, as maiores lembranças são das brincadeiras, de tomar banho no rio, fazer gaiolas, subir no pau de sebo, dos dias que passava viajando de ônibus. Pouco tempo depois teve que retornar a São Paulo por conta da seca, lá o pai trabalhava como metalúrgico e a mãe como revendedora de cosméticos. Ele fala da Mãe com muito orgulho, “Minha mãe é uma pessoa muito guerreira, batalhadora, se eu tivesse metade da simpatia que ela tem, porque ela chega nos lugares e faz amizade com todo mundo e eu já sou muito tímido” diz Nivaldo. 

A vida marcada por muitas dificuldades, com persistência concluiu o ensino médio, trabalhou como metalúrgico, office boy e em um lava jato. Mas não desistiu dos seus sonhos, hoje é um dos grandes divulgadores da cultura nordestina, encantado com a música e relembrando os sucessos de ícones do forró pé de serra, como Luiz Gonzaga.

O apelido Chambinho:

Foi a junção de duas relações, um amigo achava ele muito parecido com Chambo que era tecladista, e depois aos 16 anos esse mesmo amigo o viu comendo Chambinho, nome de uma marca famosa de iogurte. “Ele me viu na minha casa sentado no sofá comendo Chambinho e disse: não acredito que tu desse tamanho ainda come Chambinho, cria vergonha bicho da cara de Chambinho, eu fiquei muito zangado, e pronto não teve jeito ficou esse apelido mesmo” recorda Nivaldo aos risos.

O primeiro contato com a música:

  Ao lembrar-se do primeiro contato com a música deu uma gargalhada, porque foi seu tio Luiz que mora em Várzea Queimada que ensinou a tocar o primeiro instrumento, ao contrário de Luiz Gonzaga, tocava pandeiro. Com o passar do tempo aprendeu o acordeon, Nivaldo apenas tocava, seu amigo de infância Isael Veloso, atual saxofonista da banda, percebeu o talento até antes desconhecido e incentivou a cantar, a princípio ele não queria, depois de muita insistência começou tocar e cantar. Sua primeira apresentação foi para um grupo de surdos e mudos em Várzea Queimada “É engraçada essa história, a região onde a família dele nasceu, casaram primos com primos e os filhos são todos mudos e surdos, ele começou a cantar e falou que foi o melhor lugar que tocou porque ninguém falava nada, nem escutava, eles não tem do que reclamar,” relembra Isael ao risos. Depois desse momento em São Paulo aos 16 anos Chambinho já tocava em bares, de segunda a segunda, no tempo em que o forró universitário estava no auge e os estudantes se reuniam para fazer algo diferente, tocar um forró pé de serra.

“Terra do Galo” uma homenagem a Jaicós:

Uma música feita em parceria com o jornalista Ivo Farias, conta em detalhes o cotidiano da cidade e da receptividade de Jaicós, a música foi composta de um modo inusitado, por um aplicativo de mensagens, o cantor estava em São Paulo e entrou em contato se apresentando como um fã para o jornalista, a homenagem tem outra particularidade, foi composta em uma hora afirma Ivo, “foi uma inspiração instantânea, feita em mais ou menos uma hora, eu aqui no Piauí e ele lá em São Paulo”, comenta o jornalista.

Chambinho ganhou o título de cidadão honorário da cidade em 2014, esse prémio presta uma homenagem indiretamente ao seu avô Zezinho Barbosa, por ser dos maiores sanfoneiro de Jaicós. A cidade não traz somente boas lembranças da infância, ele carrega uma bagagem especial de aprendizados e inspirações para compor, foi lá que ele aprendeu a tocar e cantar, Nivaldo tem muito orgulho e gratidão pelo o município.

Anos depois em uma visita aos parentes de Jaicós, foi convidado pelo o governador Welington Dias a fazer o show na inauguração do teto de uma quadra, e por coincidência essa mesma quadra foi inaugurada com um show de Luiz Gonzaga, sempre brincalhão Chambinho disse, “ele inaugurou a quadra e eu inaugurei o teto”, pontuou com expressão risonha.  

O divisor de águas:

Nivaldo conta sobre a semelhança com Luiz Gonzaga que já era percebida pelos amigos antes mesmo de surgir à ideia para o filme, “Eles diziam que eu parecia com Luiz Gonzaga, mas eu não parecia com aquele velho feio... Ai meus amigos diziam: Não! Você, não parece com ele velho, você parece quando ele era jovem, fui pesquisar e realmente parece, mas meu primo parece mais,” relembra. 

A mulher e também produtora Daniella Piccino, inscreveu Nivaldo na seleção para o filme “Gonzaga de pai para filho” dirigido por Breno Silveira, lançado em 26 de outubro de 2016, o filme conta a história de Luiz Gonzaga e Dominguinhos, traçada por encontros e desencontros de pai e filho que apesar da distância e ressentimento se amam, e um trilha sonora que encantou o Brasil. Daniella conta como surgiu a inspiração para Chambinho interpretar o Rei do Baião “a decisão por incrível que pareça foi aqui em Jaicós em um show, eu já fazia a produção dele e em determinado momento ele puxou a morte do vaqueiro, eram 2:30 da manhã, o pessoal tinha bebido bastante e começaram a fazer o nome do pai e falavam: o Gonzaga baixou, e eu fiquei com aquilo na cabeça, conta Daniella. 

Tempos depois, ela recebeu um e-mail para confirmar o processo seletivo, a inscrição foi feita no último dia, sem o consentimento do esposo, foram mais de cinco mil participantes e apenas vinte pré-selecionados dentre eles o acordeonista. No primeiro teste, Laís Corrêa uma das preparadores de atores percebeu a fisionomia de Luiz Gonzaga em Chambinho, pediu para escolher entre interpretar ou cantar, o teste foi um desastre, porque não sabia atuar. Laís mostrou a encenação para o diretor Breno Silveira, Breno disse que ele não servia para o papel, mas a preparadora insistiu para que fizesse o laboratório. Rindo ele conta “o teste foi horrível, porque eu estava nervoso e nunca tinha atuado... Passei um ano e meio fazendo laboratório, nesse período fiquei em abstinência de tocar sanfona, por que não tinha tempo.” O laboratório aconteceu em várias cidades do Brasil, nessa fase mais parecia um Reality Show, sobram apenas quatro participantes, dentre os quatros ele tinha vantagem por ser o único a tocar acordeon. 

Após abdicar de estar com a família e dos shows, a coragem de enfrentar novos desafios valeu a pena, foi selecionado para interpretar o Rei do Baião na fase jovem, as comparações continuaram, agora pesando mais sobre ele, “Por muitas vezes pensei que não fosse aguentar a pressão, as pessoas comparavam a minha voz, a altura e diziam: Ah! mas ele não canta igual”, relembra o cantor.
Breno Silveira, queria mudar o nome de Nivaldo porque não era um nome artístico e atraente, e Chambinho é uma marca de iogurte, mas ele se negou a trocar, “Ha! Só existe dois Nivaldo famoso, eu e o Gusttavo Lima a diferença é só na conta bancaria,” brinca Chambinho.

Não deixando abater-se pelas as críticas, continuou o trabalho como ator, o filme teve reconhecimento mundial, ganhado o prémio de melhor do ano em 2012. Emocionado o artista recorda “viajei por muitos países fazendo apresentação do filme, na Suíça era o único filme brasileiro e entre tantos escolheram “Gonzaga de Pai para Filho” como o melhor”, relata.

A vida depois do filme teve dois divisores de água, na formação enquanto pessoa e no reconhecimento do seu trabalho “tudo que eu passei foi importante para me tornar o que eu sou hoje... Recebi convites para show, campanhas publicitarias, convites para teatro, novela... entrei para o show Business”, relembra orgulhoso.

Após interpretar o Rei do Baião nos cinemas, Chambinho retorna as telas participando da novela “Velho Chico” de Benedito Rui Barbosa, como um sanfoneiro Targino, “é um prazer imenso fazer esse papel e contracenar com grandes atores como Gésio Amadeu”, Diz o ator. 

No final da entrevista, fiquei tão encantada com que ele falava, que não me dei conta do que estava acontecendo a minha volta, desliguei o gravador e quando olho, estamos rodeados de pessoas que ouviam atenciosamente, sem fazer ruídos para não incomodar a emocionante história desse artista completo. Acredito que também se emocionaram ao vê-lo contar com tanta simplicidade e carisma a sua trajetória de um menino que começou no interior do Piauí, conquistou o mundo de um forma não imaginada através do ídolo nordestino o eterno Rei do Baião.

Por: Lívia Costa
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